quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Os Sarariiman


A pedido de vários alunos e amigos, resolvi voltar ^^
Bom, não com o relato do costume, da minha experiência lá, pois já passaram uns anos.... Mas com as coisas fantásticas que vou sabendo lá daquelas bandas! Espero que gostem na mesma :)

Por isso, resolvi falar de algo um pouco mais terra-a-terra.

Salaryman ou assalariado, é uma pessoa que tem um contrato com uma empresa e, que por isso tem um salário fixo.  Até aqui, tudo faz pensar num trabalho qualquer. Pois, mas no Japão, as coisas não são tão lineares quanto isso. Aliás, são os salarymen que fazem o Japão avançar, dizem os próprios japoneses.

Mas para se ser um salaryman, tem que se seguir certas regras, das quais: cabelo curto e com risca a 70% da dimensão total cabelo; se se usar óculos, estes têm que ser de metal, quadrados e pretos; gravata preta ou vermelha escura com riscas na diagonal; camisa branca; fato azul escuro ou cinzento; sapatos pretos de pele; pasta preta quadrada; no bolso direito interior do casaco, levar a agenda, a carteira, o passe e os cartões de visita. 

Apenas a pasta é que tem alguma variedade, e pode ser de 4 tipos: a dita quadrada, uma bolsa com alça (semelhante às de senhora), uma pequena bolsa de levar na mão, e pequenos sacos de viagem triangulares para quando têm que dormir no trabalho.

Mas como é então o dia-a-dia destes indivíduos?
O típico salaryman vive nos arredores e, por isso, demora cerca de uma a duas horas de comboio até ao emprego. Levanta-se de madrugada, arranja-se, toma o seu pequeno-almoço enquanto lê o jornal, e sai. 

E com pequeno-almoço, quero dizer o tradicional pequeno-almoço japonês que contém um ovo cru, arroz simples ao vapor, sopa miso, peixe estufado ou marinado, 2 ovos estrelados ou mexidos, 2 torradas e café. Se a esposa tiver menos tempo,  põem-se os restos do jantar com a sopa miso e o café. Como pude comprovar na minha estadia lá :P

Já dizem os nutricionistas, que a refeição mais importante é o pequeno-almoço!

Cerca de 10 milhões de pessoas dirigem-
se aos centros de negócios de Tóquio logo pela manhã, o que torna a viagem muito cansativa só para chegar ao trabalho: entre o tempo que se demora, as filas para aceder ao metro, os empurrões, o ir extremamente apertado, ter que ir de mãos no ar (para não criar situações embaraçosas quando alguém é empurrado contra si) , não ficar chateado com as pisadelas ou as cotoveladas, não colocar nada no arrumo da carruagem pois depois será impossível de recuperar, dobrar o jornal de uma maneira muito específica de forma a não incomodar as outras pessoas, tirar o som ao telemóvel...

E, geralmente, ainda têm que fazer um pequeno percurso de bicicleta. Neste caso, as coisas são mais simples: a Câmara, ou empresas, fornecem um serviço de bicicletas gratuito à saída de todas as estações de metro ou comboio. As bicicletas não precisam de ser devolvidas onde as pegámos, basta deixar na estação mais próxima! Muito práticos, mais uma vez.

São poucas as pessoas que têm carro e, não se justifica, pois há transportes para todo o lado. Além de que, quando resolvemos comprar um carro, só nos é permitido (por lei)  fazê-lo se provarmos que temos lugar de estacionamento quer no local de trabalho, quer em casa. 
O movimento na estrada é maioritariamente táxis, carros com motorista e camionetas de entregas. Os táxis são de evitar, pois são extremamente caros: em 2004 (quando lá estive) ir dos subúrbios ao centro da cidade ficava por 250€!!!

Assim que, finalmente, se chega ao trabalho há a reunião matinal, sendo diferente em todos os empregos. 
Se se tratar de trabalhos em obras, na reunião revê-se as regras de segurança, assim como uma sessão de ginástica de aquecimento, de forma a aumentar a vontade e o espírito de trabalho; para vendedores, as reuniões são para explicar ou relembrar a estratégia de ataque; para os trabalhadores dos shoppings, faz-se uma revisão às regras de educação para com o cliente, treinando sempre alto e bom som o "bem-vindo" para quando as portas se abrem.
Note-se, que os shoppings são diferentes dos nossos: enquanto nós temos lojas individuais, eles têm um espaço amplo e aberto com balcões de todas as lojas, como se vê no El Corte Ingles, e a maior parte dos shoppings na europa (Printemps, Marks & Spencer, etc).

Só as grandes empresas de importação/exportação é que raramente têm essas reuniões, pois o início da manhã serve para ler o jornal enquanto se bebe café, de forma a estar sempre actualizado quanto às notícias. Hehe, malandros.

Apesar da maior parte das empresas ter refeições baratas
na cantina, os trabalhadores preferem ir a bares de Soba (massa de trigo sarraceno, que se come gelada), ou de Ramen (massa com caldo, legumes e carne servida numa grande malga), enquanto que os trabalhadores recém-casados trazem de casa o seu aisai-bento (à letra: lancheira da esposa dedicada). Quem trabalha em obras, geralmente come na cantina, e depois fazem algum desporto, num campo de desporto perto.

Quase todos os empregos requerem horas de trabalho extra (que não é pago, mas o trabalho necessita ser feito) e, por isso os restaurantes que estão perto, geralmente, fazem entregas para quem fica a trabalhar. Para os trabalhadores se manterem acordados, há sempre café, chá e bebidas energéticas (feitas com pele de cobra e outros ingredientes exóticos) na empresa.

Quando o salaryman perde o último metro, tem a escolha entre dormir num sofá do trabalho ou dormir num hotel-cápsula (hotéis com camas tipo cacifos - são muito baratos, mas não há grande conforto nem espaço).

Quando se sai a horas do emprego, de forma a aliviar o stress, vai-se para bares, izakaya (tascas) ou salas de karaoke. Muitas vezes nas izakaya há um limite de tempo, isto é, fica-se 2 horas, pelo que se paga um preço fixo, e pode-se beber à vontade. No entanto, quando não existe este limite de tempo, um salaryman não se pode ir embora enquanto o seu chefe também não for. 
Resultado: o salaryman chega tarde a casa e, provavelmente, bêbado. Isso é um facto muito engraçado: de manhã, estão todos rígidos no metro, com as caras super-sérias e a olhar sempre na mesma direcção, enquanto que depois das 23h vê-se os mesmos fulanos todos bêbados a cantar e a arrastar-se  pelo metro :P

Algumas empresas têm um programa especial para os salaryman recém-empregados no primeiro emprego: o gasshuku (em inglês "training camp"), que consiste em juntar as pessoas num retiro na montanha, onde dormem num só quarto, preparam a comida e comem juntos, estudam e praticam desportos, de forma a tornarem-se adultos responsavéis em comunidade. Algumas empresas utilizam métodos educacionais extremos e únicos.

Os salários, ou kyuuryou, são determinados pela idade e pelo currículo de cada um.

Há muito mais factos e regras engraçadas na vida destes trabalhadores, mas por hoje já chega.

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